Religião: Evangelização X Proselitismo

27/02/2013 07:16

 

Para que seja desenvolvido qualquer texto que fale diretamente de religião ou de seus elementos constitutivos deve-se ter claro o que de fato é religião. Realizar essa tarefa de definição é algo complexo, portanto, há uma problemática. Religião não é algo simples, que de imediato se possa definir. Geralmente religião é definida a partir do termo re-ligare que indica uma de suas funções, a de ligar o ser humano ao transcendente. Mas, é de grande valia salientar que religião é mais do que isso, pois religar é apenas uma de suas características. Atualmente a religião vem sendo definida pela teologia como “conjunto de crenças, celebrações e normas éticas, por meio das quais, o ser intelectual reconhece, em chave simbólica, sua vinculação com o divino em duas vertentes, a saber, subjetiva e objetiva e exteriorizada mediante diversas formas sociais e individuais”.

Enfim, diante disso percebe-se que não há uma definição clara sobre religião, o que é apresentado como definição, na verdade, são elementos característicos. A vivência de determinada religião ocorre a partir de uma experiência que, em consequência, gera uma fé no Homem. Sabendo que a experiência religiosa é também subjetiva, e que a fé é ato da vontade e da inteligência humana elas necessariamente vão em busca de razões que possam nortear sua fé, daí a necessidade de uma doutrina. Mas, não existe apenas uma doutrina, mas doutrinas que variam de acordo com a fé de cada pessoa.

   Como é possível notar existem diversas manifestações de fé, e cada uma traz em si características próprias, portanto, pode-se falar em religião e religiões. Atualmente religião no singular é utilizado para designar um estudo geral das religiões. O termo no plural é utilizado para definir instituições como o cristianismo, hinduísmo, judaísmo dentre outros. Essas apesar de suas características diversificadas possuem um elemento comum, que faz com que sejam classificadas como religião. Esse elemento é a busca pelo transcendente. Devido às diversas maneiras de expressão, ou manifestação religiosa é possível perceber que há um pluralismo religioso.

   Antigamente o ambiente religioso era mais definido. Hoje devido ao pluralismo cultural, a religião por ser um fato cultural, histórico e social, também se manifesta de maneiras diversificadas havendo então um pluralismo religioso. Diante do pluralismo religioso devem-se tomar alguns cuidados, pois dentro da religiosidade não deve haver um extremismo, em que uma religião é priorizada como única, passando a ser obrigatória, ferindo assim, a liberdade religiosa. Também não se pode igualar todas pelo simples fato de que em uma nação sempre haverá uma religião majoritária, que deve ter uma atenção diferenciada. E ainda, não deve haver exclusão, ou seja, retirada da religião de todos os ambientes. Sendo assim, quando o assunto é religião deve-se ser levado em conta o pluralismo religioso que é fato, e respeitar-se a liberdade.

Dentro desse pluralismo religioso encontra-se o cristianismo, que tem sua fé fundada na vida e missão de Cristo Jesus. Um dos termos muito conhecidos dentro do cristianismo é a evangelização, inclusive atualmente já se fala de nova evangelização. Evangelizar é levar a Boa Nova, é levar as pessoas a conhecerem a pessoa de Cristo, suas obras e ensinamentos e a Ele aderir. Mas, atualmente existem pessoas que estão substituindo a evangelização pelo proselitismo. Proselitismo é um termo grego, que no contexto hodierno é utilizado para designar práticas de pessoas que tem um empenho ativista de converter pessoas a determinada causa, ideia ou religião – no caso proselitismo religioso. Se o termo evangelização é utilizado no contexto do cristianismo, proselitismo por sua vez é mais comum no âmbito social e religioso geral.

   Toda a realidade que circunda o ser humano é repleta de discursos que possuem o intuito de envolver e persuadir pessoas ao que é apresentado. Mas, há alguns de dentro do cristianismo que, ao invés de evangelizarem e anunciarem a pessoa de Cristo estão realizando um proselitismo, disfarçado em evangelização. Buscam a qualquer preço e por qualquer meio realizar conversão de pessoas, esquecendo que existe a liberdade dos indivíduos e que um grande mal que deve ser evitado, como foi apresentado mais a cima, é a imposição de uma única religião.

   Acontece que hoje muitos padres, pregadores, até mesmo leigos, estão impondo suas ideias por meio de um proselitismo disfarçado em evangelização. Basta olharmos nas mídias que será possível elencar vários pregadores que se dizem entendidos de teologia, por terem estudado em tal lugar, escritos livros, achando-se assim no direito de impor seus pensamentos como se fossem a única verdade a ser aceita. Fazem uma evangelização narcisista, tornando a evangelização um espelho de suas vontades, vaidades e egoísmos, corrompendo assim, a verdadeira essência de mensagem, impondo suas próprias crenças. Contra isso escreve Pe. Zezinho, scj, alertando que os fiéis devem ter cautela contra tais proselitistas.

 

Não é por que um padre disse que se deve comungar de joelhos e o outro diz que se pode comungar Maria na hóstia, que você vai engolir isto como verdade. Além do padre de televisão, há os padres que se especializaram em Teologia. Questione-os. Ser conhecido não é o mesmo que ser culto. (Pe. Zezinho scj - 07/12/2012 –via twitter)

 

   Tais pessoas (proselitistas) levam a pensar que sua evangelização não tem como intuito levar Cristo às pessoas, mas a si mesmos. Esse fato não ocorre apenas dentro do cristianismo católico, o protestantismo também é repleto de discursos fundamentalistas e proselitistas. Basta fazer uma análise simples para perceber discursos que levam as pessoas a se alienarem. Esses discursos geralmente vêm fundados em uma teologia da prosperidade em que os líderes buscam cada vez mais “arrastar” fiéis para suas denominações religiosas, isso causa conflitos entre as mesmas. Muitas lideranças fazem da religião um comércio religioso em que cada um busca “vender” seu produto, e os ataques com discursos ofensivos, humilhantes tendem a ser vistos cada vez mais frequentemente inclusive em mídias. Há um verdadeiro ativismo religioso expressado inclusive em forma agressiva. Cada um desses ativistas visam apresentar suas religiões como se fossem as melhores, se colocando como seres moralmente e espiritualmente superiores.

   Com tal atitude quebram completamente a possibilidade do diálogo ecumênico e inter-religioso tão desejado pela Santa Igreja, como é possível perceber nas palavras do saudoso João Paulo II, em seu discurso realizado no encontro interreligioso em 2003 em que ele dizia: “Juntamente convosco, peço a Deus Todo-Poderoso que nos fortaleça na tarefa comum de anunciar e testemunhar o Evangelho aos homens e às mulheres do nosso tempo. Que Ele apresse o dia em que, juntos, possamos louvar o Seu Nome, em plena comunhão de fé e caridade”. Para que haja esse diálogo é necessário estima pelo outro, transparência de pensamento, um esforço para compreender e ser compreendido, procurar conhecer a crença do outro e certa prudência nas relações. E, além do mais, uma grande abertura ao outro, dando espaço para que viva sua fé, mesmo que diferente, pois o verdadeiro diálogo apenas existe quando nenhum dos lados é coagido, mas cada um com sua identidade se relaciona visando um ponto em comum.

 

   Portanto, a pluralidade religiosa é fato, logo, deve haver um respeito e diálogo em que, o que é buscado é a verdadeira evangelização, ou seja, o anúncio da Boa Nova. Mas, para isso é necessário que tal evangelização seja feita com humildade, caridade e respeito à inclinação religiosa alheia.

 

Sem. Diego Novaes